domingo, 8 de maio de 2011

7 Livros de Contos

Desde Irene Lisboa, cuja maioria da obra se encontrava no registo do diário e da novela e dos apontamentos, que percebemos que o público não aceita muito bem qualquer prosa que não seja romance.


Ainda que seja uma coisa de minorias, a poesia sempre conserva uma certa "nobreza", ao passo que os contos frequentemente são vistos como obras menores dos seus autores, e até como textos sem qualquer importância. Discordo deste ponto de vista, e aqui deixo sete propostas, entre muitas outras que poderia deixar, de livros de contos; que são tudo menos obras menores.




António Lobo Antunes: Livro de Crónicas (ed. Dom Quixote)








António Lobo Antunes já conta quatro livros de crónicas. Escolho o primeiro, apenas por ser o primeiro. Qualquer um dos outros poderia estar aqui. Apesar de se apresentarem como crónicas, estes textos, publicados quinzenalmente na "Visão", são curtas narrativas, bastante interessantes e, como todos os textos do autor, interessadas em captar o mundo interior dos seus personagens. Num registo bastante mais curto, no entanto, Lobo Antunes é perfeitamente capaz de recriar a sua voz, ao mesmo tempo que torna consistentes estas personagens, que sempre nos apresentam alguma história momentânea, nem por isso menos capaz de nos surpreender.




Lídia Jorge: Praça de Londres (ed. Dom Quixote)





Com três livros de contos publicados até agora, escolho de Lídia Jorge estes "cinco contos situados", como nos sugere o subtítulo. E escolho por razões meramente pessoais: além da exploração minuciosa e humaníssima que Lídia Jorge sempre opera na sua escrita, nestes contos as cidades têm uma importância crucial, interagindo com os personagens que por ela vagueiam. Uma certa tendência para a narrativa psicológica faz-se sentir nestes textos, anunciando um pouco aquele que viria a ser o romance mais conseguido a esse nível, "A Noite das Mulheres Cantoras". Pautados por uma certa invulgaridade e, por vezes, um certo sentido de mistério, estes contos são alguns dos melhores já escritos por Lídia Jorge.



Luísa Costa Gomes: Setembro e outros contos (ed. Dom Quixote)






Luísa Costa Gomes tem publicado vários romances e também algumas peças de teatro. No entanto, a sua estreia, em 1981, dá-se com os "Treze Contos de Sobressalto" e uma boa parte da sua melhor obra encontra-se, a meu ver, nos contos. "Setembro e outros contos" surge-nos dividido em duas partes. A primeira, "Setembro" apresenta-nos contos mais longos onde as questões da escrita, da criatividade e da introspeção têm papel principal: são contos densos, analíticos, com um olhar cru sobre a realidade. Mais dispersos a nível temático, e mais curtos, mas igualmente pautados por um olhar atento e despido sobre a realidade, os contos de "Outros Contos" completam o livro.




Luísa Dacosta: Corpo Recusado (ed. Figueirinhas)





O caso de Luísa Dacosta, de que tenho vindo a falar aqui há já algum tempo, é um caso realmente de excepção entre nós: ao contrário do habitual, grande parte da obra de Luísa Dacosta é precisamente escrita em contos e crónicas. Além destas, a publicação de dois diários é ainda assinalável; e, até agora, Luísa Dacosta publicou apenas um romance, "O Planeta Desconhecido e Romance da que Fui Antes de Mim". "Corpo Recusado", de 1985, é o mais recente de três livros de contos que a autora publicou, e escolho-o por razões pessoais, uma vez mais. É neste livro que Luísa Dacosta mais plenamente consegue abordar o tema da solidão humana e do desamparo, construídos os contos, a um tempo, por uma linguagem encantarória que nem por isso é menos realista e crua no seu olhar sobre o real e, principalmente, sobre as pessoas.



Maria Isabel Barreno: Contos Analógicos (ed. Rolim)






"Contos Analógicos" é o primeiro livro de contos de Isabel Barreno, publicado já depois de dois dos seus mais importantes romances: "Os Outros Legítimos Superiores" e "A Morte da Mãe". O seu estilo de escrita pende muito para um lado analítico profundo, que se torna quase ensaístico. No entanto, a transição para textos mais curtos (Um destes contos não chega a ocupar uma página.) não apaga essa dimensão da escrita de Maria Isabel Barreno. Pelo contrário, este livro quase cataloga alguns exemplos de estruturas sociais e humanas e aí mesmo reside a sua maior força: a capacidade que tem de, em muito poucas palavras, despertar todo um sistema filosófico.




Maria Regina Louro: Sapos Vivos e Outros Monstros (ed. Relógio d´Água)




A obra de Maria Regina Louro é, a meu ver uma das mais originais, apesar da falta de visibilidade. Desde as "Novas Bárbaras" que assina com Miguel Serras Pereira até a "À Sombra das Altas Torres do Bugio", Regina Louro confronta-nos com um universo onde todo um imaginário popular se transfigura poeticamente, através não só de uma sensibilidade que não abdica nunca da uma acutilante inteligência e de uma linguagem densa e grotesca.


"Sapos Vivos e Outros Monstros" é o livro que se segue a "Apocalipse", um livro de poemas em prosa. E, nestes contos, em que a figura ou a ideia do monstro é protagonista, nota-se muito essa inclinação para a poesia, sendo que muitos destes contos quase podiam ser poemas em prosa, narrativos. O encontro com o monstro que nos rodeia e que está também dentro de nós é a força que move a escrita destes contos, uma escrita a um tempo irónica e cruel, que por isso mesmo resulta desarmante, no que toca a expor-nos a verdadeira fragilidade de qualquer monstro.





Nuno Júdice: O Tesouro da Raínha de Sabá (ed. Rolim)





Apesar de eu não ser um apreciador da poesia de Nuno Júdice (Excluindo alguns livros que me parecem de uma muito interessante linguagem simbolista.), acho que na ficção, Júdice tem obras bastante interessantes. Este "conto pós-moderno" é um bom exemplo disso, contando com uma narrativa algo futurista, mas sempre através de uma linguagem metafórica e muito poética.



De assinalar é ainda a colecção "Fantástico", das edições Rolim, uma colecção bastante longa e constituida maioritariamente por contos (Ainda que hajam algumas novelas.), contrariando a tendência do mercado para o romance.

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