sábado, 12 de março de 2011

Assim se Vive


Anda uma pessoa fechada consigo.
Assim se vive.
Se vive, se finge que vive.

Lindos dias.
Atravessam-se jardins, vê-se gente.
E a paz e o movimento e fora e dentro de casa
um vácuo, um vácuo!

Não dei aquele beijo...
Não o podia dar.
Mas senti que mo pediram.
Aquela mansidão!
Não era bondade, era só desejo.

Não dei aquele beijo que devia ter dado e acei-
tado se fosse mais hábil.
Dado e aceitado sem amor profundo.
Amor profundo!...
Dado e aceitado por gosto, gosto de beijar.
Tão raro, tão imprevisto, tão mal praticado!
Gosto do amor? Talvez.
Desespero, desespero apaixonado.

Irene Lisboa
Outono Havias de Vir
1937, ed. Seara Nova
fotografia de Ralph Eugene Meatyard

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