quinta-feira, 1 de abril de 2010

A Escada



davam grandes passeios pelos matos o coração soerguido pela prece luxuosa do feiticeiro.
davam passeios malditos, siberianos os pés nus lambidos pelos castores e pelos ratos.
espectral a luz coada trespassa-lhes a pele moça e dorida.
davam grandes passeios nos mantos vigiados pelos olhos esbugalhados da madeira.
davam-se.
nos vitrais é que as cegonhas faziam as bocas dos ninhos e os arlequins desfilavam suspirando.

o céu num esgar vomita esperma rubro.
o limiar da risada, o conteúdo do abraço.
a orla da praia resinosa desenhada em baba.
escolhemos o odor dos braços.
é o nada.
é o congresso.

esta era a continuação dos longos duas de paixão severa.
a febre gota a gota limpa a mão, pano de linho.
a mutável apenas na aparência.
sombra de éter.
deixai que a seiva corra quente.
que o ritual se cumpra.

tilintaram os guizos e soaram como solas de pulmão seco os passos dos mercenários.





Regina Guimarães
A Repetição
1979, ed. Hélastre
imagem de Max Ernst

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