segunda-feira, 28 de dezembro de 2009

As "Barcas Novas" de Fiama



O livro “Barcas Novas” de Fiama Hasse Pais Brandão (Editora Ulisseia, 1967) é um curioso livro cuja temática incide sobre episódios bem conhecidos da nossa história, não para constituir mais uma perspectiva sobre os mesmos mas para problematizar a história moderna e nessa conjectura é um livro engagé aparecendo como alternativa ao que então faziam os poetas que se reivindicavam do movimento neo-realista (ou cujas opções estéticas se enquadravam no neo-realismo; ou se não era uma alternativa, apontava pelo menos uma saída possível para alguns dos impasses com que se debatia o movimento.
O livro passa em revista o início da nossa arte de navegar a partir de um conhecido poema de Joam Zorro, poema que dá o nome ao livro, mas também à batalha de Aljubarrota, o drama de Alcácer-Quibir, a memória dos nossos mortos, o assassinato de Inês de Castro, o cerco de Lisboa.
São alusões a episódios que marcaram de algum modo o nosso viver colectivo e que servem de contraponto aos desastres que uma política suicida nos havia de conduzir nos anos 60 com o envio de milhares de soldados para a guerra colonial (em termos literários, Fiama usa-os para reflectir o momento presente; de algum modo, poder-se-á dizer que os poemas que constituem este livro funcionam, na sua globalidade, como uma metonímia).
O poema de Joam Zorro é feito, como era comum ao tempo, na base de tercetos com repetição do 3º verso de cada estrofe e era endereçado à mia Senhor velida; o poema de Fiama utiliza um ritmo ainda mais simples na base de dípticos com uso da anáfora e da rima toante e dirige-se ao leitor e não já a uma criatura especial (é um convite à reflexão; tem, portanto, funções didácticas).


[...]


Lisboa, mar e barcas aparecem nos dois poemas como pano de fundo que é comum às duas situações: a partida das primeiras naus (séc. XII-XIII) e a partida dos militares para as colónias (1960-1974).
Mas, ainda a nível de substantivos, aparecem no poema de Fiama outros vocábulos: armas, homens, guerra e terra, necessários para caracterizar uma situação que é completamente diferente daquela a que alude Zorro e até contraditória. Em Zorro fala-se de um início e em Fiama de um final (ou, pelo menos, do início de um final).





Luís Serrano (a crítica completa pode ser lida aqui.)

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