terça-feira, 31 de julho de 2007

Avanca´07

Não assisti nem a metade dos filmes a que gostaria de ter assistido, devido ao longo trabalho desenvolvido na workshop de Svetozar Ristovski na qual participei. Mas do que vi, aqui ficam pequenas impressões.












CÃES MARINHEIROS
Realizador: Joana Toste (Portugal)
Curta Metragem de Animação

Baseado num conto homónimo de Herberto Hélder, "Caes Marinheiros" assume uma inversão da realidade: os cães possuem um marinheiro, é ele o seu animal de estimação. Vemo-lo como tal de início a fim, e é nessa inversão de papéis que reside a mensagem do filme. A animação é simples, bonita, com contrastes que reforçam as ideias e os sentimentos. Boa animação, e simples.



Juízo Final: 15/20











ÁREA PROTEGIDA
Realização/ Argumento: José Miguel Moreira (Portugal)
Curta Metragem

Produzido pelo cine-clube de Avanca, "Área Protegida" é uma história baralhada, com uma resolução comovente, o que não chega para anular as abusivas presenças do factor cliché que vemos ao longo de, pelo menos, um quarto de hora, até chegarmos á verdade. Uma história bonita num filme não tão bonito.


Juízo Final: 10/20





O GUARDIÃO DO NINHO (Le Gardien du Nid)
Realizador/ Argumentista: Olivier Pesch (Luxemburgo)
Curta Metragem de animação


Esta é a cómica história do cómico Robert (Apesar de lhe não ouvirmos o nome.), cuja função é guardar e cuidar de uma seis ovos a desenvolverem-se. Entre eles, há um que se não cresce, sendo, por isso, rejeitado pelos outros. Robert, no entanto, acaba por se afeiçoar a ele, protegendo-o dos outros, e dando-lhe o seu carinho. A certa altura, parece-nos que o final será dramático, mas, na verdade, é extremamente divertido. A nivel da animação, ela é fantástica, com bonecos bem-feitos, e com apurado sentido estético, o som é também uma escolha interessante. Uma história mais metafórica do que simólica, que resulta bem pela escolhas menos óbvias numa história simples. Bom.


Juízo Final_ 17/20





O DILEMA DO PRISIONEIRO (Prisioner´s Dilemma)
Realizador/ Argumentista: Masanori Yoshida (Japão)
Curta Metragem de Animação

Fortemente marcado por imagens que nos remetem para uma certa violência psicológica, ainda assim exposta de uma forma quase inocente, "Prísioner´s Dilemma" arrasta-nos para uma série de voltas e reviravoltas na vida deste pobre prisioneiro torturado por tudo o que o rodeia. Boa animação aplicada a uma história que peca por não ser eloquente.

Juízo Final_ 14/20




ROB
Realizador/ Argumentista: Niko Kühnel (Nova Zelândia)
Actores: James Stewart, Brony Hughes
Curta Metragem


Filmado de uma forma inevitavelmente impactante, "Rob" é a história de Rob que tenta, repetidamente, roubar um banco, mas é repetidamente mal-sucedido, devido á sua própria distração. Ao fim de algum tempo a tentar, a sua sorte muda inesperadamente. Mais um final irónico, definitivamente interessante, e que, no fundo, diz muito sobre o nosso lado fraco e sacana.


Juízo Final: 15/20








LIÇÃO DE ADIÇÃO
Realização/ Argumento: Andreia Luís, Vitor Pedrosa (Portugal)
Curta Metragem/ Video-Animação

Resvalando sem demasiadas para as tendências do videoclip, "Lição de Adição", com música dos Pluto, revela-se bom na medida em que nos assoberba com uma sequência alucinante de imagens que não aparentam relacionar-se entre si. Uma espécie de plano subjectivo de uma montanha russa em paisagens dalinianas ou lynchianas, tanto faz...

Juízo Final: 17/20








NOUVELLE GENERATION
Realização/ Argumento: Artemio Benki (França)
Curta-Metragem


Com um título que se relaciona der forma dúbia com o que designa, "Nouvelle Génération" é um muito bom exemplo de uma muito boa curta-metragem. Em poucas imagens ficamos a conhecer as personagens, e o que fazem ali. A história dá uma série de reviravoltas, para pôr a protagonista frente-a-frente com o seu objectivo, ainda que esta se veja impossibilitada de o alcançar. Um drama e tanto.


Juízo Final_ 18/20








THE RUNT
Argumento/ Realização: Andreas Hykade (Alemanha)
Curta-Metragem de animação


Feito de imagens que, primeiro, nos comovem, e depois nos chocam, "O Pequeno Coelho" é uma visita ao passado de todos nós, numa forma metafórica. O tio oferece ao sobrinho um coelho, na condição de ele tratar dele e, dentro de um ano, de o matar. Desatque para a animação, simplória, mas estética. Bom.

Juízo Final: 16/20



IRON ISLAND



Argumento/ Realização: Mohammad Rasoulof (Irão)
Longa Metragem (90')

"A Ilha de Ferro" é uma visão simultâneamente realista e irónica das pessoas ignorantes, que deixam que outros se aproveitem da sua ignorância. Nemat leva milhares de famílias sem abrigo do Sul do Irão para um petroleiro perdido no meio do mar, a troco de dinheiro. Ao mesmo tempo que os explora, cobrando-lhes por um espaço com cerca de um metro-quadrado, ainda obriga os homens a retirar as partes de ferro do navio, derrete-as e vende-as. Esperto. A certa altura, o professor das crianças do barco repara que o navio se está a afundar. Ao mesmo tempo que a ilha de ferro se afunda, os donos legítimos donos decidem vendê-lo, e os novos querem levá-lo dali. Manipulando uns e outros, Nemat consegue garantir que não perde o seu ganha pão. Um filme brilhante, merecedor do prémio, com toda a certeza.

Juízo Final_ 19/20

segunda-feira, 23 de julho de 2007

Du côté de chez Swann



Longtemps, je me suis couché de bonne heure. Parfois, à peine ma bougie éteinte, mes yeux se fermaient si vite que je n'avais pas le temps de me dire : «Je m'endors». Et, une demi-heure après, la pensée qu'il était temps de chercher le sommeil m'éveillait; je voulais poser le volume que je croyais avoir encore dans les mains et souffler ma lumière; je n'avais pas cessé en dormant de faire des réflexions sur ce que je venais de lire, mais ces réflexions avaient pris un tour un peu particulier; il me semblait que j'étais moi-même ce dont parlait l'ouvrage : une église, un quatuor, la rivalité de François 1er et de Charles-Quint. Cette croyance survivait pendant quelques secondes à mon réveil; elle ne choquait pas ma raison mais pesait comme des écailles sur mes yeux et les empêchait de se rendre compte que le bougeoir n'était plus allumé. Puis elle commençait à me devenir inintelligible, comme après la métempsycose les pensées d'une existence antérieure; le sujet du livre se détachait de moi, j'étais libre de m'y appliquer ou non; aussitôt je recouvrais la vue et j'étais bien étonné de trouver autour de moi une obscurité, douce et reposante pour mes yeux, mais peut-être plus encore pour mon esprit, à qui elle apparaissait comme une chose sans cause, incompréhensible, comme une chose vraiment obscure. Je me demandais quelle heure il pouvait être; j'entendais le sifflement des trains qui, plus ou moins éloigné, comme le chant d'un oiseau dans une forêt, relevant les distances, me décrivait l'étendue de la campagne déserte où le voyageur se hâte vers la station prochaine; et le petit chemin qu'il suit va être gravé dans son souvenir par l'excitation qu'il doit à des lieux nouveaux, à des actes inaccoutumés, à la causerie récente et aux adieux sous la lampe étrangère qui le suivent encore dans le silence de la nuit, à la douceur prochaine du retour.J'appuyais tendrement mes joues contre les belles joues de l'oreiller qui, pleines et fraîches, sont comme les joues de notre enfance. Je frottais une allumette pour regarder ma montre. Bientôt minuit.[...]






MARCEL PROUST, 1913
Foto: Francesca Woodman

quinta-feira, 19 de julho de 2007

Avril Lavigne: The Best Damn Thing

PRESUNÇÃO E ÁGUA BENTA...








É com a palavra "cliché" estampada na testa que Avril Lavigne chega aos discos pela quarta vez. Quem se lembra daquelas roupas mais masculinas que costumava usar, pode esquecer: a primeira coisa que se percebe em "The Best Damn Thing" é que Avril Lavigne está mais pronta para protagonizar "The O.C." do que a própria Mischa Barton. Portanto, apenas folheando o livrinho, já é notório que no terceiro registo de estúdio, Avril se revela incongruente e até mesmo contraditória: ela, que dizia que a pop era para meninas bonitas, dando os exemplos de Britney Spears, que inclusivé criticiou por esta última ter dito que ela devia dançar; aparece-nos agora com madeixas cor-de-rosa, camisas ás pintinhas, e calções que parecem um cinto, meias de rede, enfim, que mais do que uma menina bonita da pop, que até pinta a capa do álbum de cor-de-rosa. E, depois de ter criticado Britney por causa de um comentário tão inocente, aparece-nos no videoclip de "Girlfriend" a dançar, e a cantar em "I don´t have to try"

"_I´m the one, I´m the one who knows to dance..."

Conclusão: aquela Avril Lavigne supostamente muito rebelde e má não passava de uma fachada, porque Avril Lavigne não passa de uma menina igual a todas as outras, o que só vai de encontro ao facto de ela nem rebelde saber ser.

Agora a música. O álbum abre com o irritante "Girlfriend", em que, uma vez mais pretenciosamente, ela diz

I don´t like your girlfriend

You should get a new one

I could be your girlfriend

ou seja, uma presunção que já não lhe víamos desde que dizia que era uma cantora rock. Mais tarde, dirá ainda

I am the best damn thing

That your eyes have ever seen

só para que se perceba que ela está realmente convencida que é muito boa.

O registo e o esquema das canções não varia nas quatro primeiras faixas, chegando ao cúmulo de "The Best Damn Thing" ser uma cópia de "Girlfriend". A primeira balada chega na quinta faixa, com "When You´re Gone". Um lugar-comum da pop, balada de piano, bateria e supostos arranjos de cordas. Ou seja, tem que se ser um muito bom músico para conseguir disto tirar uma boa música. Não é o caso.

E é nisto que andamos. Ora temos canções pretenciosamente rock, onde previsíveis compoisções pop se exploram com guitarras eléctricas desmedidas, baterias rápidas com beats previsíveis, vozes que chegando ao primeiro refrão já nos levam a dizer

"_Ó rapariga, cala a boca..."

de tão irritantes que são, como "Everything Back But You", "Runaway" ou, principalmente "I Can Do Better"; ora temos baladas assumidamente pop, que nos levam a perguntar se não são todas construídas da mesma maneira, e a resposta é que são mesmo. Acontece com "When You´re Gone" e "Innocence" por exemplo. "Keep Holding On" tem uma construção diferente a nível de instrumentos, mas a composição é a mesma.

Se há uma coisa boa em "The Best Damn Thing" é o esforço, que por vezes é quase bem sucedido, de não se repetir aquilo que já se fez. Mas, no essencial, o quarto álbum acaba por ser como todos os que se seguiram a "Let Go": tiros ao lado. Com o primeiro álbum até havia uma ou duas coisas que se salvavam, mas os restantes serviram só para deitas por terra o pouco que se ganhara com "Let Go": "My World" continha faixas ao vivo, o que é um erro, quando é óbvio que a voz de Avril é feita em estúdio, e que ao vivo ela não canta literalmente nada (Quem duvidar pode procurar no YouTube e vão ver que eu tenho razão.), "Under My Skin" era uma repetição barata de "Let Go", mas sem as tais poucas coisas que se salvavam. Por fim, "The Best Damn Thing" não só não é um bom álbum como ainda tem a brilhantismo de nos dizer que os primeiros três são falsos.

Enfim, alguém ensine á menina canadiana o significado das palavras "coerência" (Devia encontrar uma personalidade e mantê-la.), "realismo" (Para ver se enfrenta de uma vez que não sabe fazer música.) e "humildade"(Para ver se deixa de criticar as pessoas como se ela fosse um modelo, quando, a verdade é que não é). Enfim, uma tristeza.





Veredicto Final_ 7/20

quarta-feira, 18 de julho de 2007

Nazuc



Lento suave e firme
é o assentar das minhas patas no chão.

As ruas carregam coisas
ruidosas que se empurram e
me empurram sem razão, separando-me de mim.
Caminho pesado e o meu corpo,
rugoso e sagrado, tem pintadas
as muitas cores que os homens fazem.

Aqui estou eu, enorme e frágil,
no meio da cidade, com a minhas presas intactas.
Aqui estou eu, debaixo deste sol
escaldante que nunca me deixa
esquecer as selvas, montanhas e
imensas planícies verdes e livres
duma Índia que é minha.

do álbum "Mumadgi" de Maria João e Mário Laginha.
Letra: Maria João
Imagem: Henri Matisse

segunda-feira, 16 de julho de 2007

+10 Discos Para o Verão

Pelo segundo Verão consecutivo, deixo 10 sugestões de música para ouvir no Verão:







MASSIVE ATTACK: "Mezzanine" (1998)


Terceiro álbum, dos pioneiros do Bristol-Sound. Fusão de trip-hop com arranjos orquestrais, alternando as vozes melodiosas de Sara Jay e Liz Fraser (Cocteau Twins) com as vozes rasgadas de Horace Andy e Robert Del Naja. Por um lado a suavidade de "Dissolved Girl", uma canção com um esquema simples, mas muito conveniente, "Teardrop" ou "Black Milk" com a voz aveludada de Elizabeth Fraser, a quem já chamaram "a voz de Deus", e por outro as canções-alucionogénio "Inertia Creeps", os ritmos com ligeiras influências do árabe, e a voz de 3D a narrar uma história que foge em várias direcções, ou "Angel", onde Horace Andy consegue uma das suas melhores performances, senão mesmo a melhor, no contexto das suas colaborações com os Massive Attack. Ritmos acelerados ou envolventes para aquecer como o Sol ou refrescar.
Veredicto: 17/20







ANATHEMA: "A Natural Disaster" (2003)



Publicado em 2003, oito anos após Lee Smith se ter tornado vocalista dos Anathema, "A Natural Disaster" é provavelmente o melhor registo da banda inglesa, até á data. Mais afastados agora do doom metal, e mais próximos do rock gótico ou do gothic metal, num registo mais melódico, melancólico e enegrecido, os Anathema correm tanto na direcção de canções mais "bonitas" e simples, como o belíssimo "Are You There?", como na direcção de coisas mais agressivas como "Electricity" ou mais extremistas como "Pulled Under At 2000 Metres A Second", mas sem nunca perder a noção do lado melodioso. Muito bom.

Veredicto: 18/20






SIA "Colour The Small One" (2004)

Sia Kate Isobelle Furler, ou só Sia, ficou conhecida ao dar a voz a "Distractions" e a "Destiny" (Aqui a meias com Sophie Barker.), no álbum de estreia dos Zero7, "Simple Things". Prolongou a sua colaboração com a banda ao álbum "When It Falls", e o registo mais recente, "The Garden", é-lhe entregue quase na totalidade. O seu primeiro álbum dava-se pelo nome de "Healing Is Difficult", e seguiu-se-lhe "Colour The Small One". O segundo á construído com músicas mais harmoniosas, mas também mais pop. Ainda que alguns momentos não soem a mais do que meros clichés numa voz fenomenal, algumas canções do álbum merecem ser ouvidas, e várias vezes, especialmente num dia de bastante calor... "Sunday", "Rewrite", "Don´t Bring Me Down" ou "Where I Belong" são bons exemplos. Grande destaque, no entanto, para "Breathe Me", a canção que fecha o último episódio da excelente série "Six Feet Under-Sete Palmos de Terra" de Allan Ball.

Veredicto_ 17/20






TEXAS: "The Redbook" (2005)


Com temas melhores que outros, sendo os melhores geralmente os mais ignorados, "The Redbook", o oitavo e mais recente álbum dos escoceses Texas, é outro dos álbuns que segue a lógica dos outros álbuns dos Texas: o público ignora tudo o que for muito bom. Portanto, pouco se falou deste álbum. Feito de canções de ritmos dançáveis, mas com elaborados arranjos, percussões fortes, quer sejam electrónicas quer acústicas, guitarras afirmadas e linhas fortes de baixo. A voz de Sharleen Spiteri revela-se uma vez mais flexível, encontramo-la em modelados deiferentes ao longo das faixas, mas vestindo como se de uma luva se tratasse. É sempre bom ouvir coisas como "Getaway", "What About Us" ou "Nevermind". Quanto a "Can´t Resist", uma só palavra: repeat...

Veredicto: 16/20






JONI MITCHELL: "Court And Spark" (1974)



Sexto álbum da cantora/compositora/letrista/pianista/guitarrista/pintora canadiana. Um álbum que chegou ao segundo lugar dos tops americanos, "Court And Spark" é uma história feita de cançãos simples, mais ou menos acústicas, certamente grandiosas, mas sem perder a pessoalidade e a emoção que canções tão temperamentais como estas exigem, e sempre com a sensualidade que a voz de Mitchell tem. Obrigatórias são "Same Situation", "Down To You", "Raised In Robbery" ou "People´s Parties". Quanto a convidados há vários, e de peso, David Crosby, Graham Nash, Dennis Budimir, Joe Sample, Susan Webb ou Wayne Perkins. A capa é da autoria de Joni Mitchell que, além do mais produz o álbum.

Veredicto: 18/20







VIVIANE: "Viviane" (2007)

Poderia ser uma presença da praxe, mas não é. O álbum homónimo de Viviane merece referência, tal como merecia o álbum de estreia, o ano passado. Com uma familiar sonoridade suave, brilhante, simples e envolvente, "Viviane" divaga entre o lado mais solarengo e uim outro mais intimista e triste, marcado acime de tudo pelos "Fados..." que fazem parte do alinhamento. Peca por não ser particularmente inovador, mas não deixa de ser um bom álbum, com uma alma muito vivaz, e muito algarvia.
Veredicto_ 16/20






BILL CALLAHAN: "Woke On A Whaleheart" (2007)


Sendo o 12º registo de Bill Callahan, "Woke On a Whaleheart" é o primeiro em nome próprio, visto que os anteriores onze estão assinados por Smog. Canções consideravelmente mais alegres, mas sempre com uma sonoridade essencialmente acústica, com a marca inconfundível da voz de Callahan, acompanhada por um violino e guitarra. O próprio define o álbum como uma mistura de gospel, pop e ópera americana. Talvez sim. Numa sonoridade definitivamente afastada de Smog, Bill consegue aqui criar canções menos depressivas, antes sim com um toque de brilho que anteriormente não lhe conhecíamos. Talvez seja o namoro com Joanna Newsom... A ouvir "Diamond Dancer", "Day", "Night" e "A Man Needs A Woman Or A Man To Be A Man".

Veredicto: 16/20






FINAL FANTASY: "He Poos Clouds" (2006)





Owen Pallet é violinsta dos Arcade Fire, para quem faz os arranjos de cordas, mas é também Final Fantasy, uma espécie de alter.ego. Toca violino ou viola de arco para acompanhar a sua voz. E é um violinta e compositor raro, capaz de composições bastante irregulares, mas que executa sem a mínima dificuldade. A voz, essa, não é muito boa, limita-se a ter um timbre quente, mas é pouco flexível. A boa notícia, é que Pallet tem noção disso, e compõe de acordo com as suas limitações. Essa inflexibilidade não o impede de transparecer as suas emoções, pelo que grita e sussurra várias vezes ao longo das músicas, oferecendo-lhes personalidade. "He Poos Clouds", "The Arctic Circle" ou "I´m Afraid Of Japan" são referências obrigatórias.

Veredicto: 18/20






SARA TAVARES: "Balancê" (2006)

As origens cabo-verdianas de Sara Tavares vêm agora ao de cima, felizmente, e assim, longe ficam os tempos onde se canta na Eurovisão. "Balancê" é o sucessor de "Mi-Ma-Bô", e o melhor álbum de Sara, até á data. Marcado por canções leves e bem-construídas, cantadas em português, crioulo e inglês, caracterizadas por uma certa hedonia, "Balancê" contém momentos incontornáveis, como "Bom Feeling" (É bom ouvir qualquer coisa como Deixa a janela do sorriso aberta.), como "Balancê", a música dedicada a Maria José Sobral, a mãe da cantora, ou, principalmente, "De Nua", a canção onde a sua voz se cruza com a de Ana Moura, criando uma fenomenal dualidade entre o fado e a música cabo verdiana. Além de ser autora da maior parte das canções, Sara participa ainda como multi-instrumentista.

Veredicto: 16/20






MARIANNE FAITHFULL: "Before The Poison" (2005)


Após um best-of, nada como um álbum de originais. Marianne Faithfull pede canções a PJ Harvey, Nick Cave, Damon Albarn e Jon Brion, e consegue um dos seus melhores álbuns, talvez até o melhor desde "Broken English". Assim sendo, ficamos com um misto de canções mais calmas e outras mais isaltadas, mas todas envolvidas numa espécie de torpor do qual se deseja saír. Assim acontece em "Before The Poison", onde PJ Harvey musica palavras de Marianne Faithfull, em "There Is A Ghost", onde Nick Cave faz o mesmo, em "Last Song", música de Damon Albarn, ou "City Of Quartz" de Jon Brion. O que se passou depois do veneno ficará para o próximo álbum, mas antes, havia, de certeza, canções excelentes.

Veredicto: 18/20

domingo, 15 de julho de 2007

Patrick Wolf: The Magic Position

POSIÇÃO DELICADA






Ele não sabe se está destinado a passar o resto da sua vida com um homem, com uma mulher ou com um cavalo, mas há uma coisa que ele sabe e muito bem: fazer música. Patrick Wolf é uma figura bizarra, mas muito interessante. Apresenta-se em palco sempre de uma forma inesperada (Tanto pode estar a vestir roupa preta, como uma camisa simples, como uma t-shirt prateada com a gola em barco e umas calças de padrão de zebra.), e tocando os mais variados instrumentos.

A primeira coisa que pode saltar á vista em "The Magic Position", para quem conhece os dois trabalhos anteriores, é precismante uma radical mudança de postura, musical e visual.

Ele que surge vestido de menino na capa de "Lycanthropy" e vestido de preto em "Wind On The Wires", tem agora um ardente cabelo vermelho, veste-se ás cores, e está montado num pequeno veado de carrossel, abaixo das palavras "The Magic Position". Portanto, o visual é, de longe, mais alegre e colorido. Depois ouvimos o álbum, e é quando entendemos que a música é, também ela, mais alegre e colorida. A "Overture" diz tudo. Depois, vamos ouvindo canções que nos falam de mistérios como posições mágicas, jardins secretos ou simplesmente estrelas.


Musicalmente, "The Magic Position" é o registo mais próximo da pop da ainda curta discografia de Wolf, isto sem se tornar um mau álbum. Aqui temos também as canções mais alegres e simples. O que era a complexidade, o maximalismo de "Wind On The Wires", o que era a sensação de que tudo era irrepetível, fica esbatido em "The Magic Position".



Sem perder a identidade musical, Wolf acaba por fazer, ao terceiro álbum, uma mudança de rumo que não deixa de ser arriscada, mas que resulta bem. Um tiro certeiro. Ele já tinha dito que o seu décimo álbum poderia vir a ser um álbum de black metal, o que demostra que não anda muito preocupado com criar unidade. Esta atitude é negativa apenas se ele não for capaz de enveredar na diversidade com o mesmo á-vontade em todas as áreas. Não é o que acontece. Ao mover-se de uma sonoridade mais indie/ folk para outra mais electrónica, Wolf não sofre de uma queda de qualidade.


Quem aprova este álbum são Edward Larrikin, que empresa a voz a "Accident and Emergency", o primeiro single, e Marianne Faithfull que empresta a voz a "Magpie". Duas participações de peso que não deixam de tornar o álbum mais descentralizado. A irmã do músico, Jo Apps participa com os backing vocals, e Derek Apps toca baixo e clarinete.


Seguindo um esquema em que as músicas são, realmente, tratadas como peças de um álbum, começando em "Overture", seguindo para o tom festivo do titletrack, e continuando por sonoridades heterogénias, mas subordinadas a um mesmo estilo. Encontramos canções que podem bem ser algumas das melhores de Patrick, coisas como "The Kiss", "Augustine" ou o interlúdio "The Bluebell" seguido de "Bluebells". Para terminar, uma "Finale" rápida.


Sem a complexidade de "Wind On The Wires" ou a inocência maldosa de "Lycanthropy", "The Magic Position" não é o melhor álbum de Patrick Wolf, mas é um álbum bom, e que ainda dá mais um motivo para aplaudir o multinstrumentista britânico: teve a coragem de mudar de direcção, e de caminhar num trilho tão mal-amado como a pop.

Veredicto Final_ 17/20

sábado, 14 de julho de 2007

Laurie Anderson no Theatro Circo

ODISSEIA










Esta Sexta-Feira 13 não correu nada mal nem a mim, nem a Laurie Anderson, ela porque brilhou apresentando o projecto que lançará em breve, "Homeland", no Theatro Circo de Braga; e eu porque assisiti.
Com um longo e bem-sucedido percurso na música experimental, que começa em 1976 com o álbum "For Instants" e se prolonga por (Até agora.) 12 álbuns, que passam pelo megalómano sucesso de "O Superman" em 1982. O seu próximo álbum, objecto de análise de dois espctáculos em Portugal (Um no Theatro Circo, outro na Culturgest, a 15 de Julho.), inseridos na corrente digressão europeia, chama-se "Homeland", e são-lhe aliados conceitos como "poema épico" e um olhar "para as obsessões que a América tem com a segurança, a distância, a informação, a relação entre o medo e a liberdade, a aceitação crescente da violência e a persistente nova linguagem de guerra". Estão correctos. Tudo isto é baseado em factos verídicos.




Face ás barrocas decorações da sala, onde o vermelho joga com o dourado, e ambos jogam com a luz; o palco parecia muito minimalista. Quatro cadeiras, teclados, uma guitarra, uma tela no fundo, lâmpadas pendendo desde o tecto em longos cabos brancos, e muitas velas acesas pelo palco.
Laurie Anderson entrou no palco com os três músicos, com pouco tempo de atraso, e lança-se numa estupenda história que relata a origem da memória. A partir daí, somos avassalados por uma espécie de ópera experimental, com a famigerada dimensão épica, a omnipresente e directa componente de ataque político á América de Bush e á América típica, a que tão bem conhecemos, dos adolescentes obesos, trôpegos, estúpidos e com pouco para dizer. Há também os retratos da América que já não sabe pensar por si mesma, questiona a hegemonia da nação de W. Bush, tudo com uma adorável ironia e uma invejável perspicácia. E, no meio de tudo isto, Anderson ainda tem tempo de nos falar de histórias de humanidade, tanto pessoais, como num sentido mais geral.
Era impossível, literalmente, dizer qual foi o melhor momento de todos, ter-se-ia que referir obrigatóriamente (E os títulos podem não ser exactamente estes.) "Only An Expert Can Deal With A Problem", a beat mais forte, e um fenomenal arranjo de violino, uma letra fantástica que nos diz que só um perito pode lidar com um problema, porque detectar o problema é metade do problema, e, por surpreendente que possa parecer, ainda consegue um espacinho para o programa de Oprah Winfrey, para os Óscars, e para (Lá está.) os bombardeamentos da América. Depois, claro, "This Transitory Life" uma letra mais filosófica, com laivos de inteligência que não encontramos em muita gente; "The Sky, The Land" em que nos conta uma história de um mundo que não existe, onde o que existe são apenas imagens desse mundo, "I´m a Bad Guy", a história do tal típico americano, contada na primeira pessoa, com um irresistivelmente sarcástico
"_Cause I´m a bad guy..."
a deslizar por dois violinos em linhas diferentes.
Por muito bom que tudo isto tenha sido, fiquei sem resposta para a pergunta
"Para onde foi o expectáculo multimédia que costumava acompanhar os concertos de Laurie Anderson?"
isto porque gostaria de ter visto este último. Mas pronto, perdoa-se.
Com tudo isto, só é uma pena que este tipo de músicos passe apenas por salas mais pequenas. Claro que o Theatro Circo não deixa de ser um espaço agradável, e, a nível de programa, é provavelmente a melhor sala do Norte, precisamente porque músicos como Laurie Anderson, ou Joanna Newsom, Andrew Bird ou Patrick Wolf, ou seja, do universo da música alternativa, que folk, quer experimental, quer indie, não vão aos Coliseus, não vão ás salas grandes. Não percebo porquê, mas não deixo de lamentar que se recebam os D´ZRT nessas salas e não se receba Laurie Anderson. Uma trsiteza e um clássico português.




Nota Final_ 19/20

sexta-feira, 13 de julho de 2007

Bjork: Volta

VOLTAR AOS PRIMÓRDIOS










Sinto-me, após repetidas e deliciadas audições do sexto álbum da minha islandesa preferida, Bjork Gudmundsdottir, a falar de tal objecto. “Volta”, ao contrário do que se possa dizer, não é voltar á pop, nem voltar a coisa nenhuma. Quando muito, é voltar aos primórdios, ao ancestral, mas voltar no tempo cronológico, não nos conceitos patentes na discografia de Bjork.
Ou seja, sem que eu lho dissesse, Bjork deu-me aquilo que dela queria ouvir desde “Medulla”. Foram três anos de espera que valeram bem a pena. O que marcava Medulla eram as beats de sonoridade animalesca, ancestral, mas produzidas com a voz. A primeira coisa que pensei, quando me habituei aos conceitos do quinto álbum, foi em como seria bom ouvir a mesma sonoridade, mas com instrumentos. E é essa uma das melhores e mais exploradas ideias de “Volta”. Fica aí, igualmente, o ponto de partida: o álbum abre com “Earth Intruders”, o primeiro single, com uma beat criada por Timbaland, sopros, sintetizadores (Isso sim, é um retorno, já não os víamos desde “Vespertine”, em 2001, com excepção da faixa “Storm” de “Drawing Restraint 9” de 2005.), e o lado tribal é a primeira coisa em que se repara. Também aqui podemos estabelecer uma discreta ponte com “Medulla”, pela voz feminina que entoa algumas notas, tratada como um instrumento. Timbaland surpreende. Quem ouve as afrontas que escreve para Nelly Furtado, Justin Timberlake ou as Pussycat Dolls tem dificuldades em acreditar que seja capaz de uma criação tão genial. Ou então, como eu, decide acreditar que essa famigerada beat tem mão de Bjork. “Earth Intruders” é uma excelente canção, mas talvez uma escolha imprópria para abertura do álbum: é nela que Bjork aglomera, sintetiza os conceitos das outras canções, ou seja, dá-lhe o tudo por tudo, e talvez isso fosse mais interessante para encerrar o álbum.







Prosseguindo, encontramos “Wanderlust” que, segundo a cantora, é o ponto de partida ideológico de todo o álbum. E uma belíssima canção, nesse sentido literalmente, é bela, bonita. A voz vagabundeia sobre os sopros dos Konono nº1 e a beat, suja e demarcada.
É na terceira faixa que a voz de Antony Hegarty, dos Antony and The Johnsons, se faz ouvir pela primeiríssima vez. E muito bem. “The Dull Flame Of Desire” cabe também no conjunto das canções bonitas do álbum. Certo é que somos arrastados para uma atmosfera deprimente, mas, sem dúvida, o dueto entre Bjork e Antony é perfeito, e as percussões, crescentes, só engrandecem mais ainda aquilo que podemos chamar uma potentíssima balada.
“Innocence” volta a trazer-nos uma beat de Timbaland, não menos má que a do primeiro single, mas certamente mais reconhecível. Uma boa canção que só peca por viver demasiado do ritmo, que, por bom que seja, não chega para fazer uma canção. Mas a postura vocal de Bjork, e os discretos arranjos, a juntar a uma audição atenta, salvam tudo.
“I See Who You Are” sai prejudicada por se seguir a “Innocence”. O ritmo frenético da quarta faixa abafa quase até ao apagamento a quinta. Mas a linha de kora de Toumani Diabaté é, sem dúvida, uma traço interessante, e a marca do interesse de Bjork pelo lado acústico, que já estava óbvio em “Drawing Restraint 9”.
“Vertebrie By Vertebrie” nasce do reaproveitamento de “Vessel Shimenawa”, uma secção de sopros pertencente ao álbum anterior, á qual se acrescentou uma beat, e a voz que narra uma história um tanto violenta. O título diz tudo. Mas é, sem dúvida, uma das canções mais carnais e mais humanas de “Volta”.



“Hope” é mais uma beat de Timbaland, a última, numa canção que se aproxima da sonoridade de “I See Who You Are”, sem a decalcar, o que é importante. Ao mesmo tempo, há uma enorme harmonia e paixão efusiva em todas as notas.
“Declare Independence” é o momento mais hardcore, agressivo e violento de todo o álbum. Para já, a utilização da guitarra eléctrica é uma novidade, a beat atinge proporções de proibitivo brilhantismo, e, no fim, ficamos com um hino de libertação e anti-colonialismo, gritado com toda a vivacidade por Bjork. Uma música que não se deve ouvir sentado. E vamos dizer só isto.
Para terminar, “My Juvenille”, ainda que com os fenomenais traços da voz de Antony e da kora de Diabaté, é demasiado neobarroca para um final. Isto porque, se tivéssemos algo mais energético, não poderíamos deixar de repetir a audição. Com isto, ficamos como se tivéssemos tomado um brandy depois de uma refeição abundante.
Agora, a parte em que me assumo como fanático de Bjork, e em que chamo demagogos a essas criaturas que deturpam as escolhas dela.
Acho muito bem que ela procure na natureza aquilo que é a génese do seu som, e das suas temáticas. Bem vistas as coisas, toda a gente procura falar do que tem dentro de si. Bjork recusa frequentemente esta atitude. Nada contra quem a assume, mas não deixa de ser original não o fazer. Em relação á imagem, há que separar as coisas. Bjork é uma compositora de talento raro (Para não dizer único.), capaz de criações absolutamente fora de série, e não catalogáveis, mas a imagem é outra coisa. A imagem é o suporte, e, também no suporte, Bjork é assinalável. Cada álbum é um objecto individual que, como tal, é acompanhado pela sua própria imagem. É errado criticar Bjork por mudar de visual de acordo com as mudanças na sua música, porque ela não faz mais do que faz uma actriz, e do que fazem muitos outros músicos. Mísia faz o mesmo, Tori Amos em “American Doll Posse”. Porquê descarregar em Bjork?


Quanto ás suas participações, oportunismo não só não é a palavra certa, como não chega sequer a caber. Há que saber ter á nossa volta as pessoas certas, e Bjork não fez outra coisa. Esteve muito na berra trabalhar com o Dallas Austin, e no entanto ela não o fez. É selectiva, e tem dedo, Matmos, Nellee Hooper, Tagaq, e o próprio Timbaland têm, certamente, aos olhos da pequena islandesa, qualidades adaptáveis ás suas ideias. Se leva isso por diante, não vejo onde está o problema.
Isso ou não são críticas sinceras, ou é não ter inteligência capaz para entender o contexto da música da Bjork (Entender NÃO é gostar.) Eu acho que é mais a segunda.

Juízo Final_ 20/20

domingo, 8 de julho de 2007

Delta Goodrem: Mistaken Identity

IOGURTE DE PEDAÇOS





Tal como acontece com Vanessa Carlton, julgo que também o segundo álbum de Delta Goodrem não está publicado em Portugal. De qualquer maneira, "Mistaken Identity" merece que se lhe dê uma oportunidade, nem que seja por respeito a "Innocent Eyes", o álbum de estreia desta pianista australiana.
"Innocent Eyes" era o álbum de uma menina de 18 anos, um fresco e agradável devaneio pop, com traços mais elaborados, demonstrando que Goodrem e os respectivos produtores não ficariam satisfeito por uma típica construção "voz, guitarra, bateria, baixo, piano". Além disso, continha grandes canções, baladas principalmente, como "Will You Fall For Me", "In My Own Time", "My Big Mistake" ou "Not Me Not I", e momentos que só davam vontade de repetir a audição do álbum, como ouvir a letra de "Not Me Not I", ou o arranjo de "Will You Fall For Me".

Em "Mistaken Identity" isso muda. Ou não muda, e o problema é esse: o segundo álbum parece-se mais do que devia com o primeiro. Não é que sejam iguais, mas a evolução não é tão grande como seria de esperar.
Para começar algumas das canções recusam-se a fazer o que em Delta Goodrem era tão bom: recusar os traços típicos pop. Agora, Delta aceita-os e encoropora-os, o que é uma pena, em mais canções do que devia. "Out Of The Blue" é uma delas, "Almoust Here" que canta com um lamechas Brian McFadden é outra.
Depois, aposta demasiado na sua própria voz, deixando para segundo plano as suas brilhantes interpretações ao piano. Para se salvar, nessas canções em que deixa entrar os commonplaces da pop, acaba por revelar-se melhor pianista do que cantora. Isto porque certas canções, como o brilhante "The Analyst" têm excelentes partituras para piano. Resultado, ficamos com uma espécie de iogurte de pedaços: temos uma massa homogénia, mas, pelo meio, encontramos algo mais sólido e saboroso, que, neste caso, são estes momentos de piano, e ainda algumas canções como "Sanctuary".
Se há momentos a referir, eles são, logo a segunda faixa, "The Analyst", uma rara composição pop; o titletrack, de uma força surpreendente, "Electric Storm", um momento mais romântico, "Fagile", e "Sanctuary".
Enfim, aquilo que era avassalador e surpreendente em "Innocent Eyes", já não é novidade em "Mistaken Identity", ainda assim, não deixa de ser um álbum pop de aplaudir, por preservar a qualidade.


Nota Final_ 14/20

sexta-feira, 6 de julho de 2007

Maria de Medeiros: A Little More Blue

ELA CANTA







Quando soube que Maria de Medeiros ia gravar um álbum, fiquei indiferente. Gostei dela em "Capitães de Abril" que relizou e protagonizou, gosteu dela em "Pulp Fiction" de Quentin Tarantino, gostei de lhe ouvir a voz na declamação de um poema de Vasco Graça Moura no "Drama Box" de Mísia. Mas a cantar, não a conhecia. Depois, soube que o álbum seria de clássicos brasileiros, e não achei piada. Também Teresa Salgueiro e Maria João o iam fazer. Três álbuns de três mulheres portuguesas a cantar canções brasileiras, fazem-me fazer uma pergunta: não temos nós, cá em Portugal, bons compositores, bons músicos??? Temos que ir resgatar os braileiros. Parece-me uma escolha natural em Maria João, salvaguardo-a, porque, conhecendo o seu percurso com e sem Mário Laginha, sempre fez umas escolhas muito ao lado, mas muito certeiras. Quanto a Teresa Salgueiro não ouvi ainda o seu álbum, mas não era bem isto que esperava dela, fora dos Madredeus. E quanto a Maria de Medeiros, parece-me uma escolha perigosa para uma estreia, mas, devo confessar, que "A Little More Blue" me seduziu.
Não sendo eu consideravelmente fã de MPB, devo dizer que o álbum de Maria está produzido com perfeccionismo, a escolha dos temas é claramente pessoal, e, por isso, pouco pretenciosa, e a sonoridade coloca-nos esses temas no campo do jazz, o que acaba por se revelar uma transmutação agradável, a juntar á voz da filha do Maestro António Victorino d´Almeida, também ela suave e agradável.



Dá particular atenção a Chico Buarque de quem intrepreta nove composições, mas encontramos ainda Caetano Veloso no tema que dá título ao álbum, e no fantástico "O Quereres", Ivan Lins com "Começar de Novo", Gilberto Gil com "O Seu Amor" e Dolores Duran com "A Noite do Meu Bem". Sendo a qualidade das faixas pouco oscilante, sempre se destacam os temas de Caetano Veloso, "Acorda Amor" e "Tanto Mar" de Chico Buarque.
Maria de Medeiros surge-nos acompanhada por três músicos, o pianista Jeff Cohen, veterano da ópera, o percussionista Joel Grare, vindo da música barroca, e o contrabaixista Emek Evcil, pertencente ao jazz e á world music.
É de louvar o facto de Maria não ter a pretensão de parecer brasileira: imita o sotaque, que felizmente não lhe sai perfeito, mas não tenta nunca cantar como se cantasse samba, abordando, como a própria admite, estas canções como actriz e não como cantora.
O resultado é excelente. Entra em nós com suavidade, mas entranha-se. Maria de Medeiros tem aqui mais um trunfo, e eu, ainda que mantenha a minha pergunta sobre os compositores portugueses, só tenho que lhe dar os parabéns, porque ela fez um disco quase perfeito.


Veredicto Final_ 18/20

SBSR 2007



Dia 3.






THE GIFT (18:35- 19:35)







É muito bom ver que o facto de serem tão mal-tratados com o horário em que os inseriram, não levou os The Gift a dar um concerto menos bom. Se há algum tipo de reparação a ser feita, é só ao facto de o alinhamento não ter sido feito a pensar nos fãs mas sim num festival. As canções mais conhecidas ou menos complexas. Ficamos a sentir a falta de "My Lovely Mirror", de "Nice And Sweet" ou de "Cube", ainda que tenhamos a sorte de ter ouvido "645", "Actress (AM-FM)" ou "11:33". A entrada no palco foi bastante estranha, os elementos da banda não entraram como se o fossem, mas antes como se fossem técnicos do staff, só Sónia Tavares entrou de uma forma mais á sua medida. Por falar em Sónia Tavares, a ela os parabéns pelas escolhas na roupa, que lhe ficava muito bem, e nos deixava com a sensação de que está cada vez mais bonita. Estiveram bem, ainda que sem muitas surpresas, não percebi porque não tocaram "Fácil de Entender", uma cabnção que está tanto na berra, mas não deixa de ser uma escolha surpreendente. Destaques para "645", com a energia do costume, para "Pure", na nova versão, e para "Actress", a segunda surpresa, uma vez que é uma canção que parecia já estar esquecida. Longe de ser um dos melhores concertos dos Gift, não deixa de ter sido um momento assinalável do segundo dia do Festival.




Nota: 18/20












KLAXONS (19:45- 20:45)




Tornaram-se a coqueluche dos meninos betinhos fãs de pop/rock, mas eles que me perdoem, os Klaxons, por enquanto não têm qualidade para mais que isso. A fusão entre o rock e a dance music a que querem chamar new rave pode ter piada, mas só se for explorada de uma forma variada, o que não acontece. E, sem uma boa noção de como dar um concerto, os Klaxons colam-se ao que ouvimos no álbum, e, ainda por cima, abusam dos "oooooooooooooh" e "uuuuuuuuuuuuuh" e "aaaaaaaaaaaaaaaaaah", mas abusam mesmo, o que torna por vezes fácil que não se distinga uma música de outra. Em questões de alinhamento, o que fizeram resultaria bem com um espelho debaixo da última canção: deixaram as mais calmas para o final e inicaram com as mais agitadas, o que é um erro. Como se isto não chegasse, parecem sérios candidatos a adoptar aquela irritante estética Arctic Monkeys ou Red Hot Chili Peppers: escrever sempre a mesma canção. Momentos como "Golden Skanks" ou "Magick" não deixam de ser bons momentos, mas só vão de encontro áquilo que fica claro com o álbum: os Klaxons têm o potencial, mas ainda lhes falta muita coisa para serem uma boa banda.




Nota: 13/20












BLOC PARTY (22:25- 23:30)




Fiquei surpreendido com os Bloc Party. Ainda que "A Weekend In The City" não tenha sido suficiente para fazer sombra a "Silent Alarm", os dois álbuns tendem a ser bons. Mas não esperava um concerto mais do que razoável. E foi bom, tenho que admititr. Kele Okereke, que repetiu repetidamente que gostava do público português, mostrou-se um sujeito simpático, e não esteve nada mal. O alinhamento esteve inteliegente, compondo-se de canção ritmadas e agitadas, de maneira a não perder a aderência do público, como aconteceu com os Klaxons. Pecam, ainda assim, por terem tocado "Banquet" tão chegado ao início. Sendo a música com mais sucesso da banda, deveria ter figurado na parte final, mas não morreu ninguém por isso. As críticas ao segundo álbum geraram uma certa dualidade, há quem afirme que é bom, quem afirme que é mau, mas, uma coisa é certa: os Bloc Party sabem fazer um concerto.




Nota: 17/20














ARCADE FIRE (00:00- 01:45)




Começou com muitos minutos de atraso o concerto por que grande parte do pessoal esperava. Mas isso foi perfeitamente escamoteado pela gloriosa entrada em palco do colectivo de Win Butler e Régine Chassagne, com "Black Mirror", o avassalador tema de abertura de "Neon Bible". Ao longo da noite, quilibrou-se "Neon Bible" com o seu antecessor, "Funeral", e ainda se passou pelo EP para cantar "Headlights Look Like Diamonds". O público revelou-se fanático, acompanhando razoavelmente/bem as letras, e fazendo coros de "ohohohohohoh", essas coisas todas...


Em versões que ultrapassam, claramente, as de estúdio, ouvimos pérolas como "Haïti" (Na voz da simpatissíssima Régine.), "No Cars Go", "Neighborhood #1 (Tunnels)" e "Neighborhood #3 (Power Out)" de "Funeral" e "Keep The Car Running", o fenomenal "Intervention", o melancólico "Ocean Of Noise", "(Antichrist Television Blues)" e "The Well And The Lighthouse" do segundo álbum.


"Rebellion (Lies)" terminou o concerto, não sem deixar espaço para o grandioso encore com o grandioso "Wake Up".


Não vou falar do que senti durante o concerto, mas deixo uma ideia só: não há palavras para falar do que são os Arcade Fire ao vivo, e, se não foi o melhor concerto a que já assisti, foi, certamente, um dos melhores.




Nota: 20/20

segunda-feira, 2 de julho de 2007

Lídia Jorge: Marido e Outros Contos

8 AQUECIMENTOS



"Marido e Outros Contos" foi a primeira colectânea de contos publicada de Lídia Jorge, no já lonínquo ano de 1997. São oito contos, incluindo "A Instrumentalina", um excelente conto que teve direito a uma publicação só para si, pela Dom Quixote, no ano de 1992.
Ler estas pequenas ficções é importante por uma razão muito simples: nelas, apesar de não estar presente a complexidade tão característica dos seus romances, está presente a forma de escrever, as simbologias, a gradiosidade, a sensão de que a escrita é mergulhada em éter... tudo isso está aqui, em todos e cada um destes contos.
"Marido", logo o primeiro de todos, e o que dá título ao livro, é um bom exemplo disso mesmo: Lídia conduz-nos pela história de uma fórma tão etérea, tão natural, que, quando ela tem o desfecho surpreendente que tem, somos completamente apanhados de surpresa, ficamos com o coração aos saltos...
Merecedores de destaque são também "O Conto do Nadador", "António" ou "A Prova dos Pássaros". O primeiro (Que é o segundo.) é um conto típico da capacidade de Lídia Jorge de tomar uma coisa pequena e fazer dela enorme, sem perder coerência. Quanto a "António" já não tem a ver com isso, mas sim com a descrição de uma situação simples, mas muito interessante, que Lídia Jorge conduz com mestria, como é seu hábito, até chegar á explicação que toda a gente procura. O último segue também essa linha, mas acaba por funcionar, primeiramente, como uma crónica, um retrato perfeito daqueles comportamentos em específico, e só depois de torna um conto.
Assinalável. Um aquecimento interessante para depois entrar a matar nos romances.
«Portugal pode contar entre os seus cidadãos três dos principais romancistas actuais. O Nobel José Saramago é um, e o modernista António Lobo Antunes é outro. Lídia Jorge deverá também ser incluída. Ela escreve com uma esplêndida economia de palavras e uma beleza premente. » escreveu-se, a propósito de "O Vale da Paixão" no INQUIRER de Filadélfia. E quem tem dúvidas nem precisa de fazer muito mais do que ler um destes contos, para ter a certeza...





Veredicto Final_ 18/20

Jewel: Goodbye Alice In Wonderland

O RETORNO DA FILHA PRÓDIGA






Só eu sei o choque que tive quando ouvi "0304", o quarto álbum de originais de Jewel, lançado no final de 2003, sob a produção de Lester Mendez (Shakira, p.e.). Todos sabemos que ninguém é perfeito, e Jewel nunca foi perfeita, nunca, desde o início, em 1994, mas também nunca fez nada de realmente mau. Mas no quarto álbum, abandalhou completamente as coisas, explorava bem a sua voz, e procurava novos registos, mas esses registos não lhe acentavam bem, e eram incongruentes com os três e muito bons álbuns anteriores. O lado pop de Jewel, o lado de "Intuition", de "Stand", de "Run 2 U", não estava, simplesmente, ao nível de composições tão grandiosas como "Down So Long", como "Foolish Games", como "I Won´t Walk Away", essas sim, perfeitas.
Explicações? Só encontro uma. Jewel é versátil, o que leva diferentes produtores a levá-la a adaptar-se a eles. Mas ao passo que Ben Keith, Patrick Leonard e Dan Huff, produtores respectivamente de "Pieces Of You" (1994), "Spirit" (1998) e "This Way" (2001) a levaram sempre por diferentes caminhos, mas sempre dentro do rock, Lester Mendez decidiu ser o mecenas de um projecto de a própria Jewel Kilcher define como "uma combinação de dance, urban e folk", e o resultado é fora de linha, e nada á altura, como já disse.
Mas, enfim, três anos volvidos, Jewel retorna aos estúdios, na companhia de Rob Cavallo, que, por muito que tenha estado envolvido em projectos tão vergonhosos como os Green Day ou os My Chemical Romance, era uma pessoa possível para aquilo que Jewel tinha que fazer: retornar ao rock, simples, brilhante, e suave, por vezes acústico, mas que era o seu estilo.


O resultado chega-nos ás mãos com o premonitório título de "Goodbye Alice In Wonderland", e não se pode deixar de respirar de alívio ao ouvi-lo. Afinal, Jewel não perdeu completamente a cabeça. Consegue, com o seu quinto álbum, uma abordagem pessoal, muito intimista, onde cada canção pertence a uma fase diferente da vida da senhora Kilcher.
Não deixa de haver refrões orelhudos que são herança directa de "0304", como acontece com "Drive To You" ou com "Again and Again", mas, pelo menos, são encorporados em canções claramente Jewel, e não Jewel-não-tarda-nada-Britney. São as canções simples, bonitas, melodiosas a que nos habituou desde sempre.
"Again and Again" é o primeiro single, uma escolha óbvia, por se tratar de um dos temas mais mainstream do álbum, ainda que, não deixando de ser uma razoável canção, não tenha genica para ultrapassar a energia de "Good Day", o tenebrismo de "Last Dance Rodeo" ou o poder de "Words Get In The Way".
Talvez a melhor canção seja mesmo "Stephenville TX".
Claro que há defeitos: por vezes, Jewel abusa das vocalizações inocentes e harmoniosas, acontece por exemplo no (meloso) refrão de "Again and Again", as letras não evitam, por vezes, commonplaces dispensáveis, e alguns refrões vêm estragar as canções, ou pelo menos retirar-lhes alguma qualidade, por serem demasiado acessíveis- again, "Again and Again".
Se tentarmos situar este álbum nos anteriores, este ficaria entre "Spirit" e "This Way". Falta-lhe uma atitude mais expedita para ser "This Way", mas tem mais complexidade do que "Spirit".
Enfim, nenhuma canção aqui pode ensombrar potências como "Barcelona", "Do You", "You Were Meant For Me" ou "Till We Run Out Of Road", para não dizer outras, mas não deixamos de ter aqui um regresso de Jewel a Jewel, e por isso, "Goodbye Alice In Wonderland" já vale a pena.
Esperemos que a menina bonita do Alasca não volte a perder a cabeça.



Veredicto Final_ 16/20

domingo, 1 de julho de 2007

Vanessa Carlton: Harmonium

AVÉ VANESSA






Desconheço se o segundo álbum da pianista/ cantora Vanessa Carlton, "Harmonium" está publicado em Portugal, mas duvido, uma vez que, mesmo tendo sido lançado em 2004, só agora consegui ouvi-lo, três anos depois. Se realmente não está publicado, lamento.
É pouco claro se "Harmonium" tem o que é preciso para ultrapassar o seu predecessor, o aclamado "Be Not Nobody", mas é certo que consegue, pelo menos igualá-lo. Não se depreenda disto que os álbuns são iguais. Isso é falso. "Harmonium" ganha uma identidade própria na medida em que procura composições mais harmoniosas, arranjos mais complexos, mas também vocalizações mais inocentes. Por outro lado, ao passo que em "Be Not Nobody" encontrávamos uma grande variedade de tonalidades, em "Harmonium" encontramos, acima de tudo, unidade. É o defeito mais notório.
Sentimos a falta de momentos de solo, como acontecia com "Wanted" onde Vanessa brilhava sozinha, cantando e tocando piano; sentimos a falta de uma bateria como protagonista, como acontecia em "Prince". Ainda assim, há coisas boas para ouvir no segundo álbum:
a beleza singular de "Afterglow", a paisagem romantista de "Who´s To Say", o brilho de "Streets Have No Name", a sobriedade de "Annie" ou a suavidade de "She Floats".
Lamentavelmente, Vanessa Carlton dá o mesmo tiro no escuro que deu com "Be Not Nobody": escolhe para single o tema mais mainstream, logo, um dos piores, para ser o single de apresentação. "White Houses" repete só a fórmula do sucesso de "A Thousand Miles", limitando-se a retirar-lhe o piano acelarado. Um dos piores momentos do álbum.



Ainda assim, as canções são coerentes, como se uma gerasse a outra, e funcionam bem, sendo canções pop exemplares, preocupadas com o sentido estético, sem exageros, e sem deixar de recorrer a arranjos grandiosos. Destemida, Vanessa faz-se acompanhar de uma orquestra, aceitando o lado clássico, característico da sua formação no Conservatório.
Interessante na música de Vanessa Carlton é serem pouco claras as suas influências. Sabemos onde iseri-la, mas é difícil dizer onde pensa ela em quem. Podemos citar os nomes de Joni Mitchell, Sarah McLachlan... mas onde... quando...? É pouco óbvio.
Enfim, "Harmonium" é um álbum pop como por vezes desejaríamos que muitos fossem. Vanessa Carlton está de parabéns. Graças a musiciens como ela, ainda conseguimos acreditar que a pop se pode salvar das garras de Britney Spears ou da Rhianna...


Veredicto Final_ 16/20

Ute Lemper: Punishing Kiss

EM CARNE VIVA




Alemã de nascença, Ute Lemper iniciou a sua carreira em 1986 com "Ute Lemper Sings Kurt Weill", e o seu próximo álbum está prometido para breve. Já protagonizou peças musicais como "Chicago" ou "Cats", e a sua imagem e postura vão beber a Marlene Dietrich, Jeanne Moreau, Ingrid Craven ou Edith Piaf, mas a sua forma de cantar é, felizmente, muito sua, muito própria: carnal, visceral, irrespirável, asfixiante, extrema, forte.
A versão europeia de "Punishing Kiss", o seu décimo sétimo álbum, começa com "Little Water Song" de Nick Cave. Já aqui percebemos que estamos perante um grande álbum de uma intérprete prodigiosa. A maneira rasgada, oscilante, ora deseperada, ora calma, como canta a história de uma mulher que está a ser afogada pelo namorado é tocante, e tem o condão de nos arrastar instantaneamente para dentro do que se segue. E o que se segue não desaponta: "The Case Continues", escrito por Neil Hannon e Joby Talbot, dos Divine Comedy, mais um relato pouco óbvio, neste caso de um crime passional. Encontramos, em "Tango Ballad" de Kurt Weill, um excelente dueto com Neil Hannon, o próprio, que voltaremos a encontrar ainda em "Split", composição dos Divine Comedy. Outros compositores presentes são Tom Waits com o excelente "The Part You Throw Away", em que o acordeão, num tom cavo, se enrola com a voz, melancólica e sóbria, e em "Purple Avenue"; Philip Glass com o magnânimo "Streets Of Berlin"; e Elvis Costello, com o tema que dá título ao álbum, e ainda o fantástico "Couldn´t You Keep That To Yourself?".

Neste primeiro álbum em que interpreta autores contemporâneos, Ute Lemper não podia, afinal, ter estado mais irrepreensível: tem a capacidade de nos fazer esquecer a proveniência das canções, e se o seu nome constasse nos créditos como compositora, seria fácil acreditar. É difícil ouvir Nick Cave neste "Little Water Song", como é difícil ouvir Elvis Costello neste "Punishing Kiss".

Se há maus momentos neste álbum, eles estão muito bem camuflados, não damos por eles. Mesmo a última faixa, "Scope J", que poderia pecar por ser demasiado calma para ser a última, não soa mal, nem parece deslocada.

Percebe-se, no final, porque é tão justo que Ute Lemper seja uma diva por excelênica. Primeiro porque, não fosse ela, e a tradição do cabaret alemão era já uma memória, e segundo, porque quem faz álbuns destes, tem que ser reconhecido, senão não há justiça no universo.


Veredicto Final_ 19/20

videos para American Doll Posse de Tori Amos

Aqui ficam os vídeos para algumas músicas do novíssimo e belíssimo álbum de Tori Amos.

Bouncing Off Clouds, primeiro single na Europa, canção de Clyde, aqui e aqui e aqui.

Big Wheel, primeiro single americano, canção da própria Tori, aqui e aqui e aqui.

(parece-me que o primeiro em cada uma é o oficial, e os outros são resultados de concursos lançados pela Epic)

Ana Moura: Para Além da Saudade

TRATADO DAS PAIXÕES DA ALMA





Ao terceiro álbum, Ana Moura cotinua a confirmar o que afirmava em "Guarda-me a Vida Na Mão" (2002) e "Aconteceu" (2003): que o seu nome é digno de estar entre as fadistas que realmente o são, isto numa fase em que toda a gente quer cantar fado. Não é o caso de Ana Moura. Veio para ficar, o fado está-lhe na alma, e quando assim é, vê-se.
Mas se em "Guarda-me a Vida Na Mão" o que víamos era simplesmente uma boa fadista, havia uma faixa que nos prometia uma fadista original: a versão de "Lavava no Rio Lavava" de Amália Rodrigues. Gravando a canção com a voz das mulheres lavando no rio como fundo instrumental, percebia-se que em Ana Moura havia algo de diferente.
"Aconteceu" confirmou um pouco as duas coisas, principalmente a nível das participações com que contava, mas é, agora, três anos depois do segundo registo, com este "Para Além da Saudade", que vemos a confirmação da fadista original.


Fausto Bordalo Dias escreve pela primeira vez para o reportório de outro artista, com "E Viemos Nascidos do Mar", Amélia Muge contribui com o "Fado da Procura", Patxi Andeon musica
Fernando Pessoa em "Vaga, No Azul Amplo Solta", e Tim Ties dos Rolling Stones participa compondo ou tocando, nos últimos dois temas, "Velho Anjo"(Que musicou.) e "A Sós Com A Noite" (Onde toca saxofone.). São estas participações improváveis que não vemos associadas a outros nomes. As escolhas de reportório são pouco previsíveis, mas sempre coerentes.
A produção fica, uma vez mais, a cargo de Jorge Fernando (Mariza- "Fado Em Mim") que já havia produzido os anteriores álbuns da fadista. Não indo muito além daquilo que já fez nesses álbuns, não deixa de tirar proveito dos potenciais da voz de Ana Moura e das canções escolhidas.
Entre as quinze canções que constituem "Para Além da Saudade", há que dar destaque a "A Voz Que Conta a Nossa História", da autoria de Jorge Fernando, momento de extrema simplicidade e beleza, que nos leva a viajar por uma espécie de noite de frio, de éter, de néon e de nevoeiro; "Primeira Vez", a letra de "Até ao Fim do Fim" é um ex-libris do álbum; o dueto com Patxi Andeon é obviamente um momento alto, em que o fado parece encontrar, sobre as palavras de Pessoa, terrenos baldios pertencentes ao flamenco (?) num tom melancólico e nostálgico; assim como o belíssimo "A Sós Com a Noite" onde vagueia o saxofone de Tim Ries.
Após uma única audição de "Para Além da Saudade", torna-se fácil perder todas as dúvidas em relação ás razões que levaram Ana Moura aos palcos dos EUA ou da Holanda, entre tantas outras. Um dos melhores discos de fado de 2007, senão de sempre.



Veredicto Final_ 17/20

Inês Pedrosa: Fica Comigo Esta Noite

eXistenZ


O primeiro livro de contos assinado por Inês Pedrosa tem o belo título de "Fica Comigo Esta Noite" e é uma colectânea de doze contos escritos entre 1993 e 2002, e editados nas mais variadas publicações, desde a excelente revista "Egoísta" dos Casinos do Estoril e da Póvoa, ao "Europaexpress".
O primeiro chama-se "Só Sexo", e fala de uma relação cujo teor varia de acordo com a visão de cada uma das pessoas que a conhece, e acaba por ser um relato extraordinário, com passagens pela revolução do 25 de Abril e pela doença do cancro.
Depois, deambulamos por diferentes universos que, de várias poerspectivas, vão abordando questões relacionadas com o íntimo das mulheres e o íntimo dos homens, com a morte, a vida, o amor, a traição, a perda, a fantasia, a desilusão, o desamor. Relatos alegres e tristes, uns ainda exaltados, outros resignados, cada um com a sua voz, mas todos claramente pela mão de Inês Pedrosa.
De repente, há á nossa frente um universo cheio de vozes, por vezes rindo, por vezes chorando, mas que nos falam como acontece no conto "Conversa de Café", publicado sob o título de "Café F" na "Egoísta", em que uma mulher encontra um desconhecido no café é diz-lhe
"O senhor importa-se que eu lhe conte a história da minha vida?"
e assim nos falam das suas desgraças, e das suas alegrias. Há quem tenha assassinado o marido, há quem tenha perdido a filha, há quem tenha perdido a pátria, há quem veja a família escapar-se-lhe entre os dedos, há quem esteja a morrer, há quem não queira relações sérias, ou seja, há existências e crises existenciais, há pessoas, pessoas como nós.
E é, e sempre foi essa a melhor razão para ler Inês Pedrosa, o facto da sua escrita se tornar mais visceral, mais humana, á medida que as histórias avançam, chegando a uma fase em que respiramos o que escreve.
Em "Fica Comigo Esta Noite", parece-me que, ainda que todos os contos sejam muito bons, há quatro que se destacam por serem ainda melhores que os outros. São eles, mais ou menos por esta ordem: "Europa Plano Nocturno", "Só Sexo", "Todo o Amor" e "A Cabeleireira".
Um livro que vale a pena ler, e reler, enquanto se aguarda pela chegada do próximo romance.

Veredicto Final_ 18/20